Imagem disponível em www.purebreak.com.br Acesso em 20/04/2014
Como explicar a nova acepção de "recalque"
na Língua Portuguesa?
Por Marcelo Maciel de Almeida (20/04/2014)
Em programas humorísticos, é comum o emprego desse item lexical pela
comunidade "GLS". Hoje, deparo-me com a sigla "LGBT".
Parece-me difícil assimilar os significados das letras "S",
"B" e "T". "SBT", no meu entendimento, significa
"Sistema Brasileiro de Televisão". Bem, voltemos à questão do
"recalque"!
A primeira vez que me deparei com o vocábulo supracitado foi no Curso de
Pós-Graduação em "Linguística: Análise do Discurso" (2005-2006), na
Universidade Federal de Uberlândia. Tratava-se da disciplina "Discurso e
Psicanálise", ministrada pelo prof. Dr. Ernesto Sérgio Bertoldo. Como se
percebe, trata-se da acepção psicanalítica.
Segundo o jornalista Vitor Ângelo, o novo “recalque” não deve ter
nascido no universo LGBT. “Conheço o termo da psicanálise e a versão popular,
que denomina uma pessoa ressentida (...)", diz o jornalista.
Para um dos donos do perfil Tipos de Biscat no Twitter (@tiposdebiscat),
Leonardo Polo, a palavra ganhou destaque no Orkut, rede social que precedeu o
Facebook. “A primeira vez que eu ouvi foi no colégio. É muito de época de
Orkut, principalmente das piadinhas de briga entre divas, como Britney Spears.
O recalque aparece nesse contexto da inveja”, comenta.
Para o psicanalista Wilson Buran, a popularização do termo sem o sentido
original é um fato comum, que acontece quando leigos se apropriam de uma
palavra sem utilizar o entendimento acadêmico.
Vitor Ângelo atribui a fama do recalque à popularização de outros
transtornos. “Hoje em dia, se você está alegre em um momento e triste no outro,
você é ‘bipolar’. Não significa que seja diagnosticado, mas houve uma
popularização da psicanálise”, comenta.
A disseminação do recalque também é sentida nos estilos musicais,
especialmente no funk. Desde os anos 2000, músicas com enredos e títulos
referentes a recalque e derivados dominam as playlists de jovens frequentadores
de baladas noturnas. Lançada em 2013, a música “Beijinho no Ombro”, do projeto
solo de Valesca Popozuda, emprega o termo como sinônimo de inveja.
"É uma música que não precisa de palavrão, ela é forte. ‘Beijinho
no ombro’ é uma gíria usada há muito tempo e afastar a inveja é necessário”,
comenta a funkeira, que não lembra quando foi a primeira vez que ouviu a
palavra, mas recomenda banho de sal grosso e beijinho no ombro para combater os
males do “recalque”.
Acreditava eu que a expressão "beijinho no ombro" fora cunhada
pela grande pensadora contemporânea e feminista Valesca Popozuda. O uso
coloquial do termo "recalque" pode ser explicado pela
sociolinguística, ramo da linguística que estuda a relação entre a língua e a
sociedade. Em outras palavras, a sociolinguística é o estudo descritivo do
efeito de qualquer e todos os aspectos da sociedade, incluindo as normas
culturais, expectativas e contexto, na maneira como a linguagem é usada, e os
efeitos do uso da linguagem na sociedade.
REFERÊNCIAS:
CASTANHO, BIANCA. De Freud à gíria: recalque bate, volta e muda de
significado. Disponível em
http://delas.ig.com.br/comportamento/2013-10-05/de-freud-a-giria-recalque-bate-volta-e-muda-de-significado.html
Acesso em 20/04/2014
SOCIOLINGUÍSTICA. Disponível em
http://pt.wikipedia.org/wiki/Sociolingu%C3%ADstica Acesso em 20/04/2014
Primeiramente odeio funk,a cantora e a música...Sobre o uso da palavra ''racalque'' ser usado com outro significado que não seja a maneira correta, faz com que as pessoas utilizem a mesma no seu dia a dia e percam totalmente o verdadeiro racicínio da palavra.
ResponderExcluirTambém não gosto do funk por parecer-me que falta conteúdo em suas letras e, sobretudo, por geralmente associá-lo a música com letras vulgares.
ExcluirSei que a Língua Portuguesa é dinâmica. Contudo, sou contra esses "modismos" que disseminam o uso inadequando de uma determinada palavra.
A acepção psicanalítica do termo "recalque" é bem mais ampla e complexa.
Obrigado pelo comentário, Dany!
Olá Marcelo, primeiramente eu gostaria de dizer que seu post veio em excelente hora e foi muito esclarecedor. Eu sou indiferente em relação ao funk: não é algo que toca em meus fones de ouvido, mas também não é algo que "fere meus tímpanos". Eu achava que o termo "beijinho no ombro" tinha sido inventado pela Valesca, olha só, vivendo e aprendendo... Quanto ao uso errôneo da palavra "recalque" (muito dissipado, aliás) eu creio que seja uma forma de "ressignificação" do termo que dificilmente será esquecido por aqueles que a utilizam. Se o uso desse termo como sinônimo de "inveja", "despeito", dentre outros, não for uma "moda passageira", eu acho que um dos dois terá de se adequar: ou as pessoas ou o dicionário.
ResponderExcluirTambém achava que o termo "beijinho no ombro" fora cunhado pela Valesca, Roger! Muito obrigado pelo valioso comentário. A palavra "recalque" ganha outra significação. Trata-se da dinâmica da língua. Eu, todavia, sempre achei estranho quando começaram usar o item lexical como sinônimo de inveja, já que conhecia a acepção psicanalítica.
ExcluirRecalque.
ResponderExcluirA verdade é que criou-se uma polêmica quanto a definição da palavra " Recalque ",chegando a um contexto dissipado que foge do seu real signficado.
Alguns usam a palavra pra dizer que a pessoa está ressentida,com alguém ou com determinada situação.Outros acham que ela demonstra em dos piores sentimentos que o ser humano nutre quando são encapazes de ser,fazer ou criar algo bom em si próprio,ai passa a querer ser ou ter igual ao outro ai é quando o recalque é dado como a inveja.
Mas a verdade é que o " Recalque " caiu no gosto polular onde virou sinônimo de ressentimentos e da inveja.
Sem que se pense no significado correto da palavra,ela vai sendo usada na forma clássica e sutil de ou criticar a pessoa ressentida ou inveja.
Obrigado pelo comentário, Letícia! Acredito que essa nova acepção de "recalque" seja mais um modismo.
ExcluirApenas acho que nossa língua está em constante transformação e a palavra recalque está sendo readequada como outras já foram. Devemos levar em consideração a contextualização das situações onde ela é empregada e o nicho social onde ela é mais utilizada. No mais acho que não tem motivos para 'odiar' a cantora o que ela faz de mal aos outros? As pessoas exageram em certas coisas, eu hein.
ResponderExcluirMuito obrigado pelo comentário, Su! Concordo com você no que se refere à dinâmica da língua.
ExcluirNão se trata de repúdio à cantora. Ouvi várias vezes a letra e assisti até mesmo ao "clip". Acredito que, por preconceito, sempre associava o "funk" a letras vulgares. É interessante a nova abordagem de Valesca.
Quanto ao "clip", parece-me haver uma desconstrução do masculino, o que é cabível na arte. Talvez seja outro preconceito de minha parte.
De nada professor, me referi a um comentário ofensivo, acho agressividade desnecessária. Ninguém é obrigado a gostar de funk, eu concordo que existem letras que falam de sexo de maneira explícita, mas o funk não fala só disso, e nem sempre falou só disso: os primórdios do funk no Brasil as letras falavam do que acontecia nos bailes, e da realidade social das periferias. A contra gosto de muitos é sim uma manifestação cultural. Letras com apelo à sexualidade não devem ser restringidas apenas ao funk, o rock também tem muito disso, e até faz apologia ao uso de drogas, mas como brasileiro tem complexo de vira-latas com relação ao que vem de fora nem se dá ao trabalho de ver a tradução das músicas. Muito pop americano que brasileiro adora tem letras que não perdem pra nenhum funk escrachado do Mr. Catra. Valesca tem uma luta feroz contra a homofobia e algumas de suas músicas empoderam mulheres que sofrem violência doméstica. Ela também desconstrói a idéia de que mulher tenha que ser submissa então é por isso que tanta gente se enfurece contra ela, o diferente incomoda.
ExcluirNa engenharia observa-se que um prédio construído sobre argila resulta em recalque - significa que pode causar fissuras, trincas nessa estrutura. Estamos falando de um problema estrutural.
ResponderExcluirNa psicanálise, Freud conceituou recalque como um mecanismo de repressão dos sentimentos considerados repugnantes – pode causar distúrbios no indivíduo. Estamos falando de um problema relacionado a distúrbios.
Concluo que uma pessoa recalcada, na atualidade, é alguém que apresenta distúrbios estruturais, o que pode ser muitas coisas. Entre elas, invejosa.
Que tals?
Muito bom, Jane!!! Sinto falta de sua companhia acadêmica. Achei muito engraçado o comentário que você havia postado no face em relação a Dante. :)
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